domingo, 2 de junho de 2013

ENTREVISTA II – PARTE I



CULTURA POPULAR E... KADU FRAGOSO, MARCUS LOBO E VERA PESSOA.



CORDEL ANDANTE – Por favor, se apresentem, digam seus nomes, formação técnica e artística.

KADU FRAGOSO – Eu sou Kadu Fragoso, minha formação é em Interpretação Teatral, pelo Bacharelado da Universidade Federal da Bahia, formado em 2010, e desde então... Acho que muito antes disso, na verdade, eu já venho participando do teatro de grupo, acreditando muito nessa possibilidade de que o fazer artístico é um coletivo, sempre está ligado a um grupo de teatro. A minha grande escola também foi o grupo Viamagia de teatro que, foi onde eu estive durante a minha formação na academiam, antes da formação na academia e durante o processo de formação; na tentativa de traçar um paralelo entre aquele aprendizado visto no grupo Viamagia de Teatro e com a academia. A minha última experiência artística foi com o espetáculo: A conferência - que foi com um outro coletivo, o Oco Teatro laboratório - que estou lá há um ano fazendo parte desse coletivo, acreditando também, nessa continuidade do trabalho em teatro de grupo, bem diferente da proposta que eu desenvolvo com o Viamagia: no sentido de dialogar com outras linguagens. O teatro tem essa possibilidade maior de dialogar sobretudo com o audiovisual, então, o espetáculo “A Conferência” conseguiu desenvolver essa mistura de linguagens.

VERA PESSOA – Ok, meu nome é Vera Pessoa, também sou formada em Interpretação Teatral pela UFBA, em 2011. Não participo de nenhum grupo de teatro, já participei de um teatro de grupo com o qual não me identifiquei antes de entrar na faculdade e minha última experiência com teatro e espetáculo foi “Meu nome é mentira”, meu espetáculo de formatura, o qual a gente continuou no ano seguinte em 2012, em cartaz. Acho que foi uma experiência que está me ajudando muito para aqui agora, foi um espetáculo baseado em uma fábula de Brecht, que é super popular e acho que também foi bem importante. Evidentemente, também, fazendo contraponto com o que a gente está trabalhando agora, eu fiz uma leitura dramática de um texto de Ibsen, “Pato Selvagem”, a gente formou um grupo, que foi proposto por Cristiane Leifer e é o “Cenáculo”, um grupo de estudos teatrais. E a gente começou estudando Ibsen, realismo, e a gente deu uma parada agora, porque estamos meio sem tempo.

MARCUS LOBO – Eu sou Marcus Lobo, faço parte da cota do grupo, da cota universitária (risos) sou o único estudante, ainda, pra poder representar essa classe. Porque todo mundo aqui já é formado, phd em teatro (risos). Então, eu estou na graduação de direção teatral, no terceiro módulo, e como experiência, também, por ter vindo do interior para cá, eu sempre tive essa prática de trabalhar em grupo, porque no interior você geralmente se agrupa vai trabalhando fazendo coisas e vai se mantendo naquele grupo por muito tempo. Essa era a nossa prática no interior, e quando eu vim para cá para Salvador eu senti muita falta disso, porque eu fiquei meio deslocado. E aí eu entrei no Coletivo Saladistar, que é um coletivo de artistas, e do coletivo eu passei a integrar também o núcleo, que é um núcleo de pesquisa e experimentações artísticas e também me mantenho no grupo com uma pesquisa continuada com o teatro ritual que é o núcleo Viansatã de Artes Cênicas. E  por isso, essa nossa prática de pesquisa aqui, também tem sido muito valiosa, porque tem dado continuidade e me aberto caminhos para um outro tipo de pesquisa, que é diferente da minha no núcleo. É mais ou menos isso.

C. A. – Para vocês existe uma cultura popular? O que exatamente a designa ou caracteriza? 

V. P. – Eu acho que é inegável que existe uma cultura popular. Onde tem povo, tem cultura. Eu acho que a cultura popular é a representação cultural de um povo, uma representação inerente, de uma cultura inerente a esse povo, de origem ancestral de sua raiz. Pode-se dizer que é uma cultura cotidiana, né, do dia-a-dia, é uma cultura natural, esse tipo de movimento artístico inerente do ser-humano, ou de uma região mesmo. E é também o movimento artístico, dessas pessoas, desse meio.

K. F. – Eu tive a felicidade de fazer parte do Mercado Cultural, tem uma parte desse evento que é chamado: Caravana do Mercado, e eu gosto de falra disso porque, quando eu penso em Cultura Popular,  eu penso sempre nisso, nessa ida para o interior da Bahia. Eu acho que ali, sim, eu consigo enxergar mais essa força da cultura popular, que existe de fato! Ali eu chorava quando eu estava tocando no Terno de Reis, quando eu peguei um instrumento, eu pensei assim: “Meu deus!” Eu nunca tinha vivido aquela experiência. Eu fazia parte daquela cultura mas, me sentia um estrangeiro ali, e essa foi a maior proximidade que eu tive. A gente ia para casa de cada uma das pessoas dali, ia e comia alguma coisa, depois dançava e tocava, então, ali sim, eu enxerguei a força da cultura popular. Em Salvador eu consigo enxergar menos essa coisa popular mesmo, de raiz mesmo, mais povo, né. No interior eu consegui ter essa verdade, me pareceu mais verdadeiro, uma coisa de irmandade. Essa identificação mesmo de filosofia popular, “onde somos irmãos não por hipocrisia, somos irmãos e podemos comungar disso e venha e dance comigo, toque comigo” era uma coisa doida, imaginar que aquilo era mesmo possível. Apesar da dura realidade, que havia ali, existia uma festa só por ter outras pessoas por perto. Isso eu identifico como cultura popular, mais fortemente no interior do estado.

M. L. – Então, eu tenho me debruçado muito sobre isso principalmente, nesse momento do projeto, a tentar entender e a tentar buscar essa compreensão do que é popular, de como se constrói essa cultura popular e do que é considerado popular. E eu, inegavelmente, acredito que a cultura popular exista. E mesmo fraca em alguns sentidos, ainda existem muitas pessoas que insistem em fazer aquela cultura popular que elas cresceram vendo os pais fazerem, e elas cresceram rodeadas por aquilo e é inerente a elas, é um prática natural. Elas reconhecem aquilo como, praticamente, natural e talvez por isso seja popular, em minha opinião.

C. A. – Na formação artística de vocês, houveram muitas experiências práticas voltadas com essa cultura popular?     

K. F. – Eu não tenho como não falar disso (Mercado Cultural). Porque, a Casa Viamagia de Teatro foi um dos idealizadores do Mercado Cultural. E o espetáculo, que eu lembro muito, é um espetáculo chamado: história de bichos. Que a gente ficou, vendo bichos e vídeos. E a gente dialogava com aquilo para compor o espetáculo. Então esse espetáculo tinha essa preocupação e a minha ida para o interior, com a Caravana do Mercado Cultural, foi uma experiência muito forte pra mim. Não tenho como não citar isso, como uma grande oportunidade de continuar pesquisando isso, e foi o que me ensinou o teatro popular verdadeiro, e de como isso pode ser feito de uma forma simples e bonita. Simplicidade não é algo ruim, simplicidade é algo do qual vc pode partir para contruir essa verdade. A prática artística do ViaMagia foi muito importante para a minha formação nesse quesito do popular.

M. L. – Na minha formação acadêmica não. Eu nunca tive experiência com a cultura popular, nem com o teatro de rua. Talvez agora nessa fase do módulo III, talvez sim. Agora, quando eu morava no interior a gente fazia teatro com o que a gente tinha , a gente não sabia como se fazia teatro em Salvador, a gente não tinha acesso a esse teatro, a gente tinha acesso a televisão. Ao que a televisão mostrava, mas não iam espetáculos daqui pra lá não tínhamos acesso ao fazer artístico de Salvador, então a gente fazia teatro com o que a gente tinha, como a gente imaginava que era e de acordo com o que tínhamos disponível, com roupas que nós mesmos tecíamos, e talvez esse tenha sido o primeiro passo para o teatro popular, e para o teatro de rua, visto e construído pelas próprias pessoas e para as próprias que moram ali.

V. P. – Nunca como atriz ou pesquisadora, nunca havia participado antes, mas, sempre fui uma apreciadora de teatro, música que seja...Eu sempre gostei, eu tive uma oportunidade de uma vivência teatral, por ter amigos que faziam parte do teatro de grupo, de teatro de rua, e teatro popular então a gente conversava sobre isso e eu assistia a eles. A gente conversava, e eu cheguei a participar de uma edição da Caminhada Axé, mas, assim, pra eu usar da minha arte para construir um espetáculo ou uma coisa que seja relacionada com a cultura popular eu nunca tive essa experiência.    

C. A.- O que é o teatro de rua tem que o teatro de caixa não tem?

V. P. – Eu acho que... Bem eu já participei de uma proposta para participar de um teatro de rua antes logo que eu entrei na faculdade, só que não foi na rua foi dentro de um espaço, onde as pessoas não foram abordadas, elas foram pra lá pra fazer isso (assistir o espetáculo), e já vi muita coisa de rua, desde as mais pirotécnicas com microfone e tudo mais, às mais... No gógó mesmo, sabe. E uma coisa que sempre me fascinou muito... Acho que o teatro sempre dá um frio na barriga, mas, quando você se apresenta para pessoas que foram te ver é diferente de quando é na rua, onde tudo pode acontecer. Onde se o espectador olha e não gosta ele vai embora. Eu acho que na rua é onde você está mais aberto a dialogar com as coisas que lhe são oferecidas. Eu acho que é uma troca mais fervorosa. Como espectadora de teatro de rua eu me sinto mais próxima, mais vista, mais fazendo parte daquilo. Não sentada e acomodada. E eu acho que esse lance do risco e do acaso... Sabe? Um avião pode passar, um cachorro pode entrar. A preparação é outra, a prontidão é outra! E essa coisa do improviso existe muito, porque você está mais suscetível. E você vive o desafio de entreter uma platéia que foi pega de surpresa.  Não foi lá pra ver você. Ela estava passando e se interessou ( ou não) e parou para ver aquilo (ou não). Eu acho isso bem excitante.

M. L.- Eu acho que o que Vera falou de teatro feito na caixa meio que proteger a quem assiste é verdade, porque ele está em um estado... Querendo ou não tem um distanciamento né, tem um comodismo porque a platéia saiu de sua casa para ver aquela peça, e na rua, não. É tudo muito perto, e ao mesmo tempo você pode estar com a atenção daquela pessoa na sua mão e o telefone dela pode tocar e ela ir pra casa correndo, e não tem nada que a impeça de ir para casa naquele momento. Ela pode chegar, se interessar e ficar até o final ou ela pode se levantar e sair. Então o trabalho do ator, nesse sentido de captar a atenção do grupo e mantê-la no espetáculo até o final, para contar uma história, na rua, é bem mais importante nesse sentido, a grande diferença é essa: requer do ator um trabalho dobrado pra manter a atenção do espectador.

 (CONTINUA)



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